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sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Episiotomia

Este é um tema que eu já queria ter apresentado há algum tempo, mas o afastamento em relação ao meu parto também me ajudou a explorá-lo de uma forma diferente, com experiência pessoal nesta que é uma das práticas cirúrgicas mais usadas em Obstetrícia em Portugal, muito além da "meta traçada pela OMS para o número ideal de episiotomias em cada país - 10% dos partos vaginais."(1)

Consiste numa "incisão no períneo e na parede vaginal que tem por objectivo facilitar o parto e evitar uma ruptura." É um dos poucos procedimentos "realizados sem qualquer consentimento da mulher."(1)

Aqui começa a minha discórdia em relação a esta questão. O parto na sua parte física já é um acto de violência para a mulher cujo corpo sofre várias alterações que ocorrem de forma natural. Mas a episiotomia não é natural e nem sempre se justifica, embora seja preferível a deixar que o períneo rasgue por si. Se nos questionam e nos fazem assinar tantos documentos quando estamos a entrar no bloco de partos, porque não sermos consultadas acerca deste assunto? É uma violentação do nosso corpo, de uma área sensível e que tem uma recuperação difícil. Afecta a mulher tanto física como psicologicamente, podendo interferir também na recuperação da vida sexual do casal. Mas sem darmos conta, já está, já nos cortaram e agora resta esperar que nos cosam e que a recuperação ocorra da melhor forma.


As dores de uma episiotomia não se dão no acto do corte em si, mas sim mais tarde. Custa a sentar, a deitar, a dormir, a amamentar porque não temos uma posição confortável. Falam tanto das hormonas nas aulas de preparação, deviam sim preparar-nos bem melhor para esta fase do pós parto. Ninguém nos diz que mês e meio após o bebé nascer, ainda temos uma costura sensível a qualquer toque, ou que ficamos doridas quando andamos de carro.

Os benefícios da episiotomia confundem-se com os danos que pode provocar. "A OMS contesta o uso rotineiro desta técnica" alegando entre outras coisas que esta "não previne a maioria das situações para as quais está indicada, em particular as lesões graves."(1)

"Bárbara Bettencourt Borges, contesta a teoria de que a episiotomia previne as lesões do períneo", enquanto que a enfermeira Maria Lurdes Francisco concorda que existem lacerações graves do períneo provocadas "na sequência de uma episiotomia" salientando que "falta calma na obstetrícia."(1)

Quem, como Luís Graça, defende este procedimento, afirma que "é uma forma de evitar que o bebé esteja muito tempo no pavimento pélvico."(1) No caso específico do meu parto, em que a apresentação do bebé era pélvica, não contesto a utilização deste procedimento, no entanto, poderia mesmo não ser necessária - não disponho de conhecimentos para o afirmar de ânimo leve, é apenas a minha opinião de mãe - uma vez que o tempo de dilatação foi muito curto e o tempo que estive em trabalho de parto foi também reduzido, pelo que penso que mais algum tempo para terminar a dilatação e proceder à expulsão sem ajuda deste procedimento porventura não me seria prejudicial nem ao bebé.

Com a mesma opinião, Paulo Moura (director do serviço de Obstetrícia do Hospital Universitário de Coimbra) defende que "a atitude própria de um obstetra perante uma mulher en trabalho de parto é a de não arriscar." Mas, então e a calma que nos incutem e que deveriam envolver o ambiente do parto, nesta que é uma altura tão crucial na vida da mãe e do bebé, não será assim literalmente cortada por uma intervenção muitas vezes desnecessária? A contração ou não distenção do períneo passa muitas vezes pelos "sucessivos toques" a que a mulher é sujeita, bem como ao facto de permanecer deitada "presa a uma cama durante o parto."(1)

Segundo a doula Carla Guiomar "não existem períneos que não se distendem. Há períneos menos elésticos do que outros. Estes são os que, provavelmente, vão sofrer lacerações."(1) Segundo a Dra.  Ester Casal (Hospital Garcia de Orta) esta é uma prática cada vez menos utilizada no H.G.O. - o que não invalidou que eu tivesse sido sujeita a essa intervenção. As próprias mulheres não contestam a utilização desta prática e, eu acrescentaria até, que não existe disponibilidade dos médicos para no pós-parto nos explicarem os seus motivos para a realização desta intervenção.



Bibliografia:

(1) - AMORIM, Mª João, "Episiotomia: sim ou não?", Pais e Filhos, Maio de 2006

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